Incubadora de Empresas – CRITT (Centro Regional de Inovação e Transferência de Tecnologia)

Conteúdo atualizado em 11 de março de 2023.

Juiz de Fora conta hoje com uma Incubadora de Empresas de Base Tecnológica (IBT), o Centro Regional de Inovação e Transferência de Tecnologia (CRITT), da Universidade Federalde Juiz de Fora (UFJF).

A incubadora é o Nucleo de Inovação Tecnológica (NIT) da Universidade, vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Tecnológico (Sedetec). Como outras incubadoras, foi criada com o objetivo de auxiliar empresas inovadoras a desenvolverem seus negócios.

Ressalto aqui meu objetivo de apresentar a realidade apenas. Desejo que o mercado se desenvolva e que os pontos fracos (da incubadora, das instituições de ensino) sejam corrigidos para que tenhamos cada vez mais sucesso em nossa cidade.

Em 2008 apresentei um projeto, fui aprovado e tive minha empresa Incubada no CRITT por alguns anos, até sua graduação, chegando até a incorporar outra empresa de desenvolvimento mobile também incubada.

Depois de alguns meses na incubadora, comecei a observar melhor uma certa precariedade em vários aspectos. Comento aqui apenas a minha experiência dos anos que passamos lá.

Segurança

Por várias vezes a incubadora “dormiu” de portas abertas. Não havia uma organização eficaz do tipo “depois da 18 horas a porta deve ser trancada”. Como o prédio era dividido com outro órgão da UFJF, o pessoal não ligava muito se a porta estava trancada ou não ao irem pra casa no final do dia. Quanto a segurança da informação, uma vez que o acesso físico é frágil, não há informação que fique segura.

Transferência de tecnologia

Tentamos algumas vezes contato com professores da Universidade com o objetivo de trabalharmos juntos, desenvolvendo produtos, aplicando novas tecnologias, enfim, transferindo tecnologia. Nunca (eu disse NUNCA) conseguimos sequer sentar com um professor para conversar. Outras empresas incubadas passavam pelo mesmo problema. Cheguei a ouvir dizer que os professores não gostavam de trabalhar com as empresas incubadas.

O único professor com o qual tivemos contato, nos procurou para fazer o site de uma instituição da qual fazia parte, e veio através da recomendação de sua filha. Virou um cliente.

Facilitação de contatos

Existia uma promessa de que empresas incubadas teriam contato com grandes empresas, investidores e facilitadores. Durante todo o processo de incubação apenas uma vez apresentamos projetos para um investidor no CRITT. Este investidor, eu tinha conhecido num evento em Belo Horizonte e sugeri que viesse a Juiz de Fora.

O CRITT não tinha contatos com empresas para realizar qualquer tipo de “ponte” entre “nós e eles”. Sentíamos falta disto, queríamos ser colocados “na boca do gol”, e eu reclamava disso periodicamente, mas acabou sendo outra promessa não cumprida naquela época.

Conexão e telefonia

A incubadora deveria oferecer internet para as empresas, mas a conexão funcionava esporadicamente. Passávamos horas por dia sem conexão… Imagine você, uma empresa de tecnologia, em um nucleo de inovação tecnoloógica, sem acesso a Internet. Parece piada mas não é.

Reclamávamos, como sempre fazíamos quando algo estava fora do esperado. 

Depois de muito reclamar, resolvemos contratar nossas próprias conexões, foi quando descobrimos (da pior maneira possível) que a infraestrutura da universidade não comportava novos cabos de telefonia. Ficamos nessa condição insustentável por meses. Quando estávamos prestes a desistir, conseguiram movimentar a prefeitura da Universidade para facilitar a passagem de tais cabos. Enfim, cerca de 10 meses depois de entrarmos, pela primeira vez, tínhamos conexão de internet 24 horas por dia, 7 dias por semana.

Apenas em 2011 a UFJF atualizou toda sua infraestrutura de rede e passamos a ter conexão de alta velocidade. Mesmo assim, ela não nos atendia completamente e precisamos continuar mantendo (e pagando) outra conexão.

As regras do firewall da UFJF eram fora da realidade para empresas de tecnologia. Não tínhamos acesso a FTP nem SSH por exemplo, algo vital para trabalhar com sistemas online. Além disto, a universidade desligava a conexão em feriados e alguns finais de semana.

Eu sei que parece piada, mas não é.

Adicionado em 2023: em conversa com empresas incubadas, me falaram que a conexão ainda é um problema real por lá.

Empresa privada

Na incubação, você tem uma empresa privada dentro de um órgão público, e são duas realidades bem diferentes.

A universidade nunca se lembrava que existiam empresas dentro de seu espaço físico. Em alguns feriados prolongados a universidade desligava a internet, já que não teria “ninguém” trabalhando.

Por algumas vezes fui trabalhar em feriados e fui proibido de entrar no prédio, quase nunca havia ninguém no departamento de segurança que pudesse aprovar minha passagem e assim eu tinha que voltar pra casa.

Depois de algum tempo criei uma rota de entrada (meio que tipo um bandido), para conseguir chegar ao prédio do CRITT sem ser percebido pela segurança. É a adrenalina dos feriados.

Politica

A administração do CRITT me parecia ser um cargo politico na UFJF. Escolhem algumas pessoas, dão os cargos, pagam um pouco mais no final do mês e pronto.

Outra coisa estranha que acontencia, era quando o diretor do CRITT se esforçava muito em ajudar-nos, mas, não tinha autonomia ou autoridade o suficiente para resolver o problema, porque dependeria de uma aprovação ou aceite de alguém acima. A estrutura era toda muito engessada.

Foi interessante conhecer o Brasil que a maioria não conhece, convivendo com a realidade de um órgão público diariamente. 

Se fosse preciso comprar um bebedouro, esperaríamos ao menos uns 12 meses, o produto entregue seria de baixa qualidade, não seria instalado corretamente, e por final, só teria água morna. Tudo o que precisava ser comprado seguia esse modelo, por final, os desejos reais nunca eram atendidos e os problemas sempre parcialmente resolvidos, e a gente tinha que se contentar com isso. Como tudo o que depende de política no Brasil.

Energia elétrica

Não havia um mês sequer que não ficávamos uma tarde inteira sem energia elétrica. Consegue imaginar isso?

O impacto na produtividade era enorme. Depois de muito reclamarmos, compraram um gerador. Meses depois da chegada do equipamento, tinham ainda que esperar o edital da empresa que iria instala-lo, e ali ele ficou parado por quase um ano. Mesmo depois de instalado, ainda não tinham conseguido “configurar” corretamente e continuávamos sofrendo com falta de energia elétrica periódicas, até o final da nossa incubação.

Ar Condicionado

Esta foi a maior novela que vivemos no CRITT. No primeiro verão dentro do galpão da incubadora, cozinhamos. Como tínhamos chegado a pouco, ficamos meio sem jeito de reclamar pra valer. No ano seguinte, já na primavera, estava insuportável. Eu e o proprietário de outra empresa incubada (Petherson da Infomobi) resolvemos reclamar. Nossas equipes não se sentiam bem trabalhando em um forno, até porque as equipes de T.I estão acostumadas a trabalharem em ambientes climatizados.

Mensalmente a direção do CRITT realizava uma reunião, RIP, para alinhar com as empresas as ações e apresentar no que estavam trabalhando. Insistentemente reclamávamos do calor excessivo nestas reuniões, bem como outras muitas coisas que estavam aquém do esperado. Em determinado momento a reunião passou a ser bimestral, porque o CRITT não conseguia atender nossos pedidos e as reuniões pareciam capítulos repetidos de uma mesma novela.

Passamos então o verão de 2008 e de 2009 no forno. Eles diziam que estavam vendo, que iriam abrir uma licitação e a coisa simplesmente não ia. Não nos permitiam também colocar o ar condicionado por conta própria em nossos “boxes”. Em 2010, quando o calor começou a chegar já estávamos “por aqui” com essa história, exigimos que nos permitissem instalar os equipamentos, e por fim cederam. Dai até o dia em que ligamos os aparelhos também foram alguns meses, porque dependíamos da equipe de manutenção da UFJF para fazer os cortes nas janelas e puxar a energia elétrica.

Resumo da ópera; durante 3 anos nós e nossas equipes trabalhamos em um ambiente muito quente (o suor escorria pela testa). No verão de 2011 o ar condicionado licitado chegou, mas a empresa da Bahia que fez a venda, só vendia, não instalava, e o mesmo só foi instalado quase um ano depois, no inverno seguinte.

As empresas que já estavam lá antes de nós, já haviam reclamado até cansar do calor (e de outras tantas coisas), mas desistiram de “dar murro em ponta de faca”. Estes empresários que chegaram primeiro nos davam muito apoio e nos incentivavam a reclamar.

Inovação tecnológica pra que?

Nos quase 4 anos que estive com minha empresa incubada, não percebi nenhum esforço “autêntico” da UFJF em fazer o CRITT ser um sucesso.

Nunca vi o reitor entrar naquele prédio.

Olhando pro céu

Em 2015 tomei conhecimento de que a UFJF está investindo mais de 10 milhões de reais na construção de um planetário. Tenho certeza que o CRITT não recebeu nenhuma fraça deste valor nos últimos 5 anos.

Que vocação é esse pra astronomia, que eu não sabia que Juiz de Fora tinha? Já a vocação para tecnologia, eu achava, que era evidente.

Não existe o curso de astronomia na Universidade, e já ouvi falar até que o ponto ali não é adequado para observação do espaço.

Me parece que abre-se ai um novo espaço para ter custos, mais um prédio para se deixar sucatear, ao invés de melhorar o que já existe na Universidade. Penso que é preciso investir na coisa certa. Mas é só minha opinião.

Parque tecnológico

Em 2008 quando cheguei no CRITT, já diziam que o Parque Tecnológico estava quase pronto.  Pronto pra começar a ser feito.

Em 2011 se não me engano compraram o terreno mas até então (2014) não iniciaram as obras porque não conseguiram a liberação ambiental para a construção.

Em 2018 me convidaram para um evento na prefeitura para um super lançamento. Para minha surpresa, era o parque tecnológico. Era a quarta vez que eu vi aquela apresentação.

Enquanto o parque estava lá todo “embargado”, não sei ao certo o porque, cria-se e se constrói um planetário, está lá. Preciso aprender mais sobre o que é foco.

Em 2022 o parque voltou a ser o foco (pelo que tudo indica), a UFJF conseguiu um novo recurso e parece que em breve estarão começando a primeira etapa, que é um prédio dentro da UFJF, do lado do CRITT.

Mas, acredito mesmo que o parque trará bons negócios para a cidade, que dará maior visibilidade pra gente, quando realmente existir. Só nos resta aguardar.

Transferência pra que?

A questão da integração das empresas com os professores, ou do mercado com a academia, vejo hoje (2023), que não era um problema do CRITT especificamente, trata-se de uma cultura onde o acadêmico precisa produzir teses e repetir o que já foi dito por alguém, produzir uma série de estudos para serem arquivados e melhorar sua classificação no lattes, ao invés de criar algo focado no mercado.

Tenho visto algumas empresas prosperando com estas parcerias atualmente, mas são aquelas onde um dos sócios é professor da universidade e com isso consegue um número incrível de bolsas, aprovações em projetos de fomento e demais recursos. Acaba desenvolvendo um grande numero de projetos, já sabendo que parte deles nem nunca será usado. O foco é captar o edital.

Não estou falando que estão errados em fazer isso, vamos lá, cada um faz o que quer. Mas já se tornaram profissionais em se beneficiar da máquina pública e do modelo ali instituído.

Concluindo

Dou crédito para o CRITT, acho que é uma instituição necessária, porém, sem investimentos não terá grandes casos de sucesso.

Atualmente tenho visto a direção do CRITT muito mais empenhada em estar conectada a realidade, não só das empresas incubada mas também do mundo que existe ao redor do campus da universidade. Fico feliz em ver que pessoas interessadas, buscando vencer as barreiras legais e políticas para criar um ambiente propício para o crescimento.

É um ponto positivo no mercado de tecnologia na cidade? Sim. Também sei que não é tudo o que parece ser, e não podemos imaginar que é um polo de tecnologia ou algo do tipo, é apenas uma pequena incubadora, com poucos recursos, sem articulação e com pouco acesso ao mercado da inovação.

Referências


Dossiê do Mercado de Tecnologia de Juiz de Fora

Este conteúdo faz parte de uma coleção de posts relacionados e que representam meu ponto de vista sobre o mercado de tecnologia e sua evolução na cidade de Juiz de Fora.




Tiago Gouvêa

Full-stack Developer, fazendo códigos desde o século passado. Criador da metodologia "Aprender programação em 20 horas" e diretor da startup App Masters, voltada para o desenvolvimento de aplicativos. Apaixonado por tecnologia e viciado em café.

Respostas (2)

Escreva uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Carlos

    Gostei muito da sua crítica. Infelizmente, temos que lutar muito, e desgastar, para tirar burocracias desnecessárias. Já presenciei professores recebendo demandas do Critt, em reuniões na faculdade, porém ninguém mostrou interesse devido que isso diminui o tempo para a dedicação em ensino e pesquisa, o que são extremamente cobrados. Além disso, são mais valorizados os professores com publicações com alto impacto cientifico em relação aos professores que fazem inovação tecnológica.

    É necessário um esforço conjunto de todos os âmbitos do poder público e das empresas para mudar essa realidade.

  2. Dossiê do Mercado Tecnológico de Juiz de Fora Tiago Gouvêa

    […] Incubadora de Empresas – Centro Regional de Inovação e Transferência de Tecnologia (CRITT) […]